sábado, 2 de fevereiro de 2013

A Marcha


    Os impávidos soldados de terracota em seus tempos áureos, tempos de exímia pontaria, tempos de sangue e medo, combateram fervorosamente hordas de mongóis e diversos outros inimigos do império. E em seu enredo magnânimo e mágico, hoje obsoleto como todo antiquário desfrutam de petrificada paz, emudecida e matizada pelo capitalístico ritmo dos flashes dos turistas ávidos por um bom ângulo, triangulando suas posições sem imaginar a glória deste magno exército, excelso em batalha, porém péssimo em seus lares, em que deixaram seus filhos talvez cianos, suas mulheres magentas. Filhos magros, mães desesperadas, procurando um método à moda de seu século, de ganharem seu sustento.

    Merecedor de pergunta é o sangue que tinge rubramente cada espada, cada lança, cada armadura vencida, será que esta é a origem de suas cores, meu pétreo exército? Ou é só a cor angustiada da terra que os cobriu, quando sua utilidade foi repensada? Relembrar seus tempos é como o ressoar do sopro de uma flauta. Seu lirismo épico é constituído das mesmas forças que atuavam nos campos de batalha, forças estas, que não permitem que a verdade seja extraída. Forças que perpetuam as lendas nas vozes dos bêbedos bardos que cambaleiam de vila em vila, espalhando este etéreo folclore.

    As dobras que o tempo acumula em seu lenho, demarcam as aspirações fantásticas, soberbas dos povos. Seu povo, Imperador Qin, não seria diferente, assistiram surgimento dos estados guerreiros, calados, apenas esperando a mão grotescamente fina da unificação deitar sobre os ombros do império e assim cessar a sua violenta conquista!
    
    Eis que perquiro novamente se as mesmas dobras temporais poderiam despertar de seu sono milenar os imortais Guerreiros de Xian tão logo o capitalismo feroz ruísse quanto a China assumisse o posto de maior potência do mundo. Pois não bastará a abnegação feita pelos continentes ocidentais, eles lutarão por seu superficial comodismo, seu lúdico controle mundial, enquanto, a população, ludibriada pelas inúmeras mentiras conspiracionistas, assistirá a renovada Ascensão destes impávidos Soldados. Por que há, nas monótonas pontas de destino o mesmo riso escarnioso que havia nas bocas sanguinolentas daqueles generais chineses de outrora, hoje eternizados nos livros de estratégia bélica, que muitos de nós interiorizam em seus jogos pessoais de poder. E enquanto houver esse riso tenebroso, essa necessidade arcaica de domínio. Haverá utilidade para os guerreiros de terracota.

By: Bruno

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