quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Lassidão


Ó vida minha, não te importas
Se a sina de momento, é de além?
E se um tédio ebrioso me retém
Como o bater de inexistentes portas

Inaudito, envolto do riso 
Vertiginoso da madrugada;
Cujo pleno silêncio desalma
Os passos nada firmes com que piso

Este chão incoerente e sem mistério
Deste século nulo de euforias,
Cadafalso de inertes folias
Não, sei porque ainda permaneço sério

A espera da próxima tormenta
Que me ilumine, ilibada
Certeira e desprogramada
E surja a flama que me fomenta!

By: Bruno

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Pés de bailarina


Eu vou dançar sobre toda a dor!
Raíla Barreto

A Terra cessa de girar para que você dance
Entre sombra e claridade, no sublime transe
Do silêncio astral, melodia onde eclodem
As inspirações efêmeras que, no corpo tremem

Assumindo a forma dos fenômenos que se sublevam
Fazendo os séculos transformarem-se em um instante
No corpo, planeta na alma imóvel, onde se revelam
Os infinitos, de forma tão simples e ondeante

Como o visitar de vagas lembranças 
Guardadas nas rodas da história
Dos homens comuns e sem glória
Cujas vidas inúmeras guardam manchas

As mesmas manchas que seu corpo
Cheio de fins e começos, secreto
Como um mundo de labaredas, repleto
De ardores e crepitações, mesmo morbo

Inaugura a máquina das eternidades
Como um símbolo caído no inédito
Fazendo o sofrimento não dito
Sob seus pés, fabular as imensidades 

Que divisam os sonhos e a memória
Entre força e elegância, traço a traço
No olhar que cria o mito baço
Do movimento da realidade transitória

Seu mito me embriaga e minh'alma, sacio
Mergulhando nas suas lágrimas, tenro rio 
De ondas que a dor traduzida na dança
Resguarda no olhar que você lança

Ao mundo que a vê e inerte, deplora
Sem compreender da dança, a maravilha
Tão viva e misteriosa quanto o agora,
De ter a lágrima da mesma cor da sapatilha!

By: Bruno

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Poética


Perdi meus passados acontecimentos,
Ao chão joguei meus grandes temas,
Ao descartar todos os meus dilemas
Percebi viver remendando meus pensamentos

Abdicar aos porquês e adentar no centro do real
É aventura criada, meu puro alimento
Onde movente, tudo se cria e, me invento:
De ofício, a sintaxe acolhe minha gênese virtual

Em todos os poemas, a hora passa igual, entrelaçada
Entre o visível e o invisível
Fonte abstrata da minha paisagem, sina aguada
Onde fanal não é somente o risível

Minha vida: problema sinestésico da Linguagem
Vê na eplepsia das sombras das árvores
Todas as possibilidades dilacerantes dos amores
E nos trópicos dos sonhos, a ébria dança da miragem

Me sopra os códigos e os clamores dessa arquitetura
De som e signo que içada nos silêncios da essência
Se faz vida, se faz universo, na medida da ranhura
De vossa unha no quadro negro da existência.

Como conclusão;
Na eternidade do presente,
Mordido pelo dente do tempo
Me fabrico numa folha branca.

By: Bruno

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Jogo de cena

Invasor de mim mesmo
Eu sonho que sou eu
Num ajuste de promessas
Com a vida impura
Que leva tudo que é meu.

Foi num ninho de sílabas
Que me percebi mero espólio
De inúmeras alvoradas 
Coligidas num pequeno mistério
De silêncios proferidos
Feito areia arrastada por vento.

Mesmo quando incógnito
Sei quem sou, número x
Da equação perdida 
Na apostila do acaso, 
Que me esmiúça mas não desfaz
O oceano escondido em minhas pálpebras.

Dia e noite passam no meu coração
Jogo de luz e de cenas espatifadas
Venço quando me perco
E perdendo sou infinito 
No terreio finito do eu mesmo.
Faço claridades para me divertir
No escuro que permanece intacto
Que me reintegra quando espalhado.

By: Bruno

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Alarde

Grita, grita, candeia de minh'alma
Antes que tu feneças e nada possas fazer
Para o mundo em teu peito reter
E esquecer o peso d'uma figura alva 

Que, do amor e tudo o que isto significa para ti
Possas guardar dos anjos, que com purezas
Tentam forjar as tentadas aventuranças
Para, dos suicidas extrair o aclamado rubi

Que figura sincrético no irrefragável desamparo
Enquanto a noite escorre entre as mãos vossas
E dilacere as plumas das frágeis asas

Com que tentas com tanto despreparo
Voar juntamente com as significações
Que em vão procuras em suas humanas ações.

By: Bruno

Evocação da pureza


Para as Estrelas de cristais gelados 
As siderações vão puras galgando
O turbilhão de memórias vai nevando
Docemente sobre minha vida, açucarados

Momentos tanto vividos quanto imaginados
Músicas vão suavemente traduzindo
Em ondas nevoentas, estes ritmos alados
Que, sem planejamento vão me conduzindo

Ah etérea brancura evocada
Como podem os desejos infinitos, 
Com tão vivazes bramidos

Num inverno inventado,
Serem como tua tez, lívidos, 
Numa eternidade sem ritos?

By: Bruno

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A ressaca de Hórus


Hórus impacientado
Que a tudo vê e sente
Preso no eterno repente
De onisciente emoldurado;

Que achas do mundo em que acordaste?
Confuso, imagino, com tantas visões,
Totalmente cerceado por inúteis razões
Num céu vertiginoso e sem estandarte,

D'onde ergueste as vastas pupilas
E os grandes glóbulos arregalaste 
Percorridos das trevas que tanto alastraste
Para prolongar teu grande Sono que sibila

Em nós, a magia austera da conspiração,
Dize-me, Hermes era tão ingênuo assim,
A ponto de dar a narcísica vasão
À estes vãos cultos e festins? 

Inda qu'em calmas mensagens o vento ermo
Te perpasse quando acordas, e traduza esta era
À vaga sombra do dia enfermo; 
No teu coração não haveria um espanto que reverbera?

Contrastando com a tua Graça, amarga e triste
Quanta melancolia se funde à tua vazia comunhão
Numa procissão de todas agonias que existem
A pedir o cessar, negado à exaustão

No espasmo da lembrança de áureos passados
Teu vulto não soma-se aos vagos letargos,
E tua eterna existência ao puro sarcasmo;
Conquanto de toda fé só restou o escarro?

Toda esta labiríntica nevrostenia
Dos ocasos ridículos das eras
Acumulando tantas inúteis quimeras
De plenitude, não o levaram à revelia?

Posto ser constante o pecado e longo o sono
O costume revogou Tuas potências supremas
Ao buscar sempre sensações efêmeras;
Concordo, vil foi a queda de teu trono!

By: Bruno

sábado, 2 de novembro de 2013

Para além da via férrea


Quantas tardes, cabem numa tarde?
Sem despertar o tenso alarde
Nas árvores que, pousadas nos pássaros
Abrigam a cidade em seus verdes escassos.

Coberta de nuvens e de fumaças carbônicas
A vida qualquer segue, trilhos adentro
Paralelas aos ventos soprando densos
Feito pianos dolentes e pirrônicos.

Nem onomatopeias mais carregam
As locomotivas, só a vida sofrida
Da cidade em seta de única ida,
Enquanto as corporações prosperam,

As rotinas condenam, aventuras lícitas
E o chilreio do lucro, sorri
Enquanto eu mil vezes morri
Diante dos trilhos que principiam solícitos.

A minha aventura, que existia sem mim
Partilhada pela teoria do macio capim, 
Efêmero e longínquo, campo sem fim
Hoje substituído pela trilha férrea

Muitos são os dias que cabem num dia
As tramas dos bichos urbanos, assim eu lia
Em seus silêncios vertiginosos 
E sombras, deduzivelmente telepáticas.

Com a morte misturada na garganta
As pétalas florescentes surgem 
E ignoradamente, fulgem
Sua pequena cosmologia de planta,

E um urubu, esgarçando-se nas nuvens
Não contrasta em nada com o mercedes-benz
Do executivo que negocia o espólio da morte
Do capitalista, que não teve da vez a sorte.

O que falar então das noites poucas
Para tantas horas de sono esquecidas
Enquanto nossos morcegos barganham
As vozes que preferimos tanto moucas,

Que a natureza fecha os olhos coloridos
E as neuroses se tornam nossos alaridos 
Tão perpétuos quanto seus bichos guardados
E seus córregos imobilizados.

Escorrendo de nossos vulgares dedos
Como se o tempo se misturasse ao medo
E ao cisco que invade o olho ardido
Dos que têm suas retinas vendidas

Ao processo de amanhecer amontoado
Nos trens que percorrem sem metafísica
Apenas o suor acumulado
Durante toda a vida tísica 

Da metrópole, onde a vida jorra
Arquitetura auditiva 
Eternamente remoldurada
Sem jamais pensar, na Via-Láctea
Essência latente da mentira humana.

By: Bruno