sábado, 31 de agosto de 2013

Poema à inexistência declamada


Surdas e translúcidas
São as montanhas abandonadas
Pela tua presença breve e lúrida
Nas grandes altitudes nevadas

Onde cintila a recente ausência
Dos teus passos sobreviventes
Às borrascas mas não à fremência
Do homem, criatura adstringente

E febril, que não distingue
O silêncio e o relento,
Pensando consumir da carne o alento
Da foice divina e onilingue

De Gaia, que assiste compraz,
A resignação das pedras empedernidas
Pelo tempo, que não se demora, atroz
Em emudecer a eternidade adormecida

Na imaginação que não pode ser admitida:
Pelos que não passaram por uma completa 
E inexorável aniquilação;

Pelos que não resistem ao atravessar
Desconexo do tempo, discrepante e secreto
Dos homens e dos habitantes do céu.

Bruno Borin 

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Soneto metálico

Sob a excelsa forma do concreto
Lá estão sem alma, sem calor
Permeando o ambiente com o palor
Do aço dissecado, funcional e ereto,

Dispensando qualquer claridade
Seja do pasmado sol ou da antiga lua,
Ocupando da verve a sapiência nua
Espargindo o legado da artificialidade.

Máquinas, metáforas de nós mesmos
Traduzidas por mistérios devorados,
Em módulos de tempo e assiduidade,

Tentativa de repartir a solidão em sesmos.
Motor, serras tornam o caminho desarvorado 
E pronto para pavimentarmos a eternidade.  

By: Bruno

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Meu silêncio

Meu silêncio é o mais barulhento de todos os silêncios
Nele, há corredores imensos, como os de shoppings,
Com montras projetoras dos meus irrequietos desejos
E estacionamentos para as alegrias e sofrimentos
Com vagas preferenciais para as palavras mais fugidias,
Aquelas que insistem em não significar amplamente
Os ruídos convulsivos do epitélio do tempo
Que comprime estes meus corredores até deliquescer
O grito encantado, desta matéria descuidada
Que compõe o meu silêncio.

Entre chilreios e miados,
vou tecendo o inverno instável
Onde deposito minhas mãos cheias de tempo
E meus sentidos cheios de vazios
Na carne da ortografia
Como quem deposita moedas velhas
Afim de preservar o ofício de suas efígies
Nos cofres bancários.
E onde as minhas paisagens não se convergem,
As dicotomias inexas ao produzir em mim,
Facécias, moldam também a razão
Dos meus lábios cerrados,
Como quem busca a boca da sede
Porém jamais cede
Aos escrúpulos do vento
Que, diligente, irrompe o mundo
Trazendo histórias em folhas de relva
E pétalas roubadas.

By: Bruno 

Canção às árvores de cranberry


De manhã, as árvores de cranberry
São importunadas por mãos indesejadas
E o tremor da folhagem caluniada
Arranha o vento como um estandarte
Denunciando a inocência entorpecida
De todas as árvores frutíferas reconhecidas.

O único momento em que essas tolas árvores
Percebem um pouco da vereda da terra,
Já que a realidade dos homens as erra
De vista e de tato,
Ocorre quando seus frutos são retirados
E colocados nos mercados e nas greenstores

O sol que as lambe nas quentes tardes 
Sabendo que ao passar da primaveril estação
As árvores de cranberry já não lembrarão
Que um dia tiveram frutos, ri covarde
Enquanto elas se porão a romper novamente
O lucro carmesim dos agricultores hostis 
Que sempre ignorarão seus direitos civis
De trabalhadoras sazonais permanentes.

By: Bruno

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

A barata me fustiga 
Toda e qualquer esperança cômoda
De assepsia
E a possibilidade de voo
Em seu zunir, me assovia
Um fadigoso tremor
Sem o leve bramir,
De imaginar tudo isso
Que causa ao somente existir.

By: Bruno

As horas


O reflexo da luz é a aura da hora
Condicionada à numeração incerta
Do relógio no pulso da pessoa certa;
O dia se deita e o encontro fica em mora.

O inverno esconde a minha vida
Cheia de eus impacientes 
Todos tão hermeticamente cientes
Que a eternidade é uma dívida vencida,

Porque, trêmulo na noite, é o breve alento
Da flama acendida à isqueiro, no intento
De imitar a mortalha do firmamento
Num breve e sórdido momento 

Sob a tutela do fogo, empilho meus eus
Imigrados de cantos distintos do meu ente
Esfacelado e fingido de doente,
Barco ébrio navegando aos léus,

Missal de mãos estendidas 
Como folhas trementes
A que são tão tementes?
A Deus? Não, Ouroboros,
Medo dos retornos eternos!

By: Bruno 

Estilhaço


Com olhos para o céu, me procuro,
Me perdi no meio de tantos eus
Nascidos do rumor das árvores
Que, frisadas pelo vento
Gemiam de frio, sugavam seiva
Fofocavam eriçadas, farfalhavam
Embriagadas com suas próprias toxinas

E eu? Tantos eus... Passeata
Manifestação em prol da esfinge,
Sentimento esfíngico manifestado,
Porta escancarada ao eterno retorno
Ancorado silábicamente ao epitáfio
Do sonho acordado, onda além-vida

O silêncio dos passos,
No horizonte de concreto,
Zumbe a verdade dos meus eus
Perdidos na claridade sombria
Das lâmpadas fluorescentes,
Constelação elétrica, suspensora
Das eternidades, metáfora dos negócios
Imaginativos, vozes de tantos eus calados
No sonho fragmentado,
Forjado pelo idioma das efemeridades.

By: Bruno 

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O buquê horrendo


Ó florações ebúrneas, leprosas
Sangue coalhado, espargido nas pétalas
Negra nevrostenia a percorrer as cabalas
Dos estames minguados, sinuosos;

Delírio convulsivo, errante a se prostrar
Nas almas seduzidas por este buquê
Deletério, com novas ramagens a dissimular
A efervescência do caos hediondo e sem porquê

Ó ócio do espírito a arrigar lágrimas através
Dos espinhos projetados para porfiar 
As imaginações sidéreas gelando, deleitoso revés,
Constritas por estes malditos caules, a nos manejar

Mouca floração, envolta em asqueroso sudário
Pensas que está mesmo tão oculta;
A desmoronar mundos, como um velho templário?
A Despetalar doridos corações, como um tépido vulto?

Fatigado farfalhar imerso em falso mistério
Volúpia do deslumbramento, clama febril a flama
Para o incêndio derradeiro, assombro gaudério,
Anseia ter o lenho a crepitar; e o poema proclama

O tenro encanto das brumas fumosas
Alentadas por névoas de pólens serpentinos,
A contaminar nossos pulmões meninos,
Que uma vez me despertaram sensações danosas! 

By: Bruno

domingo, 11 de agosto de 2013

For you, my lost friend

A gentle breeze upon my shoulder,
Sight the poor cherish of the city
That I'am linked with, soft insight
Of my pointless eye of traveller

So I look at the dark sky gleam
In my lonesome search I have seen
The multitude of hidden vault 
Eternity among the mistful clouds

I'ts you, It's you, I just know!
Some sharp claws and blue eyes 
O eternity, how rude are your lies!

My lost friend, my devoted moon howl
As a cat you did much indeed
So a separation was a motion in need...

By: Bruno 

Soneto da ambivalência

A luz jaz nos lábios do mundo
O silêncio e o grito, embora opostos
Remetem ao mesmo sentido imposto
Da dicotomia estabelecida no abismo

Dos desencontros, foice nunca cega
Da vida e da morte, amor e ódio
Fogueira que urde, aclamado ópio
Dos poetas, que sempre negam

A ausência da eternidade, efígie
Da reciprocidade alegada em tudo,
Até no ateísmo mudo

De Deus, perante sua próspera espécie
De deuses, criadores de criaturas,
Fazedores de plenas caricaturas!

By: Bruno

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Minha Terra


Minha pátria é onde os prédios impávidos
Denigrem a vida dos homens, e estes nada sentem,
Vivendo em simulacros de sonhos esquálidos,

Tendo sorte no azar, ao negociar a vida
Nos bancos, consignando em suas hipotecas
O lucro dos capitalistas e seu desprezo por bibliotecas

Minha cidade tem um céu tão inocente
Que recebe as fumaças alegremente,
E nem imagina que está ficando todo asmático,

Continuando a mostrar uma ou duas estrelas
Guardando o resto delas em seu egoísmo infante
Reservando para si as musas mais belas.

Na minha terra, as poucas árvores apostam corrida
Com os metrôs lotados, numa manhã florida
Enquanto o sol mata de sede os vagões estacionados.

Num rigor planetário, os aviões nos perpassam
Pousando sua constelação parafusada
Nas lâmpadas que em seu caminho se avolumam. 

E nos alimentam, os supermercados
Com uma flora e fauna pasteurizadas,
Requinte químico da modernidade cancerosa;

E alimentados seguimos nossa jornada fadigosa
Perseguindo a eternidade - vagão sem trilhos
Que jamais alguém embarcou para ver frondosa

A paisagem cinzenta onde demolição e construção
Se confundem em um mesmo feitiço
Não podendo ser resumidos a um cálculo inteiriço,

Embora as pombas sobejem um firmamento reconstruído
Voando com suas penas sujas de graxa e óleo de motor
Tudo o que elas encontram são seus ninhos combalidos

Pelos homens que as têm como roedores praguentos
Sem ao menos ter semelhantes, qualquer traço ou odor 
Apenas bicos rústicos e pezinhos nojentos...

Nas feirinhas, todos compram uma Vênus de acrílico
Para dar de brinquedinho às menininhas, 
Antes que os fiscais confisquem os lucros fatídicos,

Enquanto muitos aguardam a permissão do semáforo
Para respirar novamente o monóxido de carbono
Que nos carbona as hemácias sem qualquer abono...

Na volumosa e líquida São Paulo, as estações
Não chegam a borrar as inflações do Real;
Os helicópteros patrulham os acidentes feito arribações 

E a vida é orgulhosa como um defunto putrefato 
No paraíso dos homens, o happy hour leal
De cada dia desprovido de sentido translato

Na metrópole, minha terra, eis o fato
Não passo de um punhado de algarismos
Sou um, sou todos, como dizem os meus aforismos

Amo, recebo, compro, como, sou estatística
Preencho um cadastro, passo a existir
Com ou sem metafísica.

By: Bruno