terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Carta ao silêncio


Não sei o que os vazios representam,
não costumo os preencher com minhas 
pendentes completudes, que fomentam 
as intrépidas tentativas das manias;
E conluindo em si mesmas, concepções vagas
são impressões dos meus caminhos brancos.
Como pensei: o nada ao ser definido não se torna tudo.

Sobre minha semelhança com os deuses,
Carrego os conflitos que me marcaram 
de um rubro solvente de minha constância...
Dono de mim mesmo? Indecisa existência,
Que leva ao fado de embater minha essência
Aos rios que queimam, aos vales que afundaram
E aos Abismos; estes me elevaram como altas doses.

Nos versos fora do ritmo, erro a porta do sentimento
Falo muito de sentimento e de erro por arremedo,
Assim nada tem fronteira e tudo termina em mim mesmo
Não importando quais rios, tudo se termina em esmo
Remando por fingir remar, prolongando o acordar cedo:
Não é por falta de ir, que tudo em aprofundamento,
Finde em infinito, comigo a contar o segredo das coisas.

Fazer versos para arrumar os sestros, agir como possível
E obter o resultado factível: o mecanismo roda,
Para que tudo continue o mesmo, e a vida absorta,
Num hino inconsciente e dele o repente e crível  
Da ideia fixa surge, conquanto os papéis fiquem hirtos,
Tangendo secretamente os literais bramidos
Com a imagem de um afazer a se movimentar.

Molemente estendido, no silêncio para o qual murmurio,
Verifico se as coisas todas estão em seus lugares todos
E se eu estou em mim, envolvido pelas esguias mãos do vazio
Cansado do acordar variegado das transições avençadas
Definido pelo indefinido, à rasca das portas emolduradas;
Não ouso abrir nenhuma que meus versos não tenham aberto;
Estrangeiro à vida, entretanto jamais cometi alguns êxodos.

O vazio é uma sala inteiramente adornada, enfim;
Uma jornada irrestrita e contundente de volta a mim 
Onde tramito minhas Petições nuncas ouvidas 
E redecoro a montra das sensações nunca sentidas;
Na eterna noite interna, as cadeiras sempre convidam,
Mas não consigo me sentar, me sentindo à véspera
Dos movimentos sem plano, estes que desejo tanto planejar.
Estes que teimo tanto a não escutar...

Bruno Borin

sábado, 27 de dezembro de 2014

A reclamação de João Cabral


Mas será pedra só pedra
 Mesmo lapidada,
Não passando de Agedra
Na terra fustigada?

Sim! Uso da fórmula matemática
Para que meu tracejo reflita a aptidão
Da língua, que advinda da humana razão,
Trabalha de forma tão fluida e prática

Na boca do cotidiano e das gentes
No seio da vida, ao sol a pino,
Nas ruas sem destinos aparentes 
Entregue ao relento do ensino!

Que me interessam os campos harmônicos,
Enquanto meu povo padece agônico,
Na singeleza de uma vida severina
Em que a criatividade atua tão sovina?

Uma faca que corta o corpo do poema
Assim espero, a partir do vomitado floema
Surgir as ideias digeridas, no osso e na língua;
Uma infecção ramificada na voz, na íngua.

Uma bala que rompe da voz e singra
No mar das palavras, à procura de concha
E flor, mas só encontra a matéria absconsa
e desamor, do desprezo e da náusea?

E o relógio que canta feito o galo 
O ensinamento do tempo, que rarefeito,
Esboroa em duas pontas de uma corda estreita
Morte e vida, bebida socada no gargalo!

Este é o poema, nada de alma a pulsar
Sem escalas e compasso, 
Só esqueleto trôpego a se movimentar
E uma faca só o aço.

Este é o poema, cadáver a remendar
Sem familiar traço,
Restando o corpo inerte a putrefar
E uma bala vertida no ocaso.

Este é o poema, nada a declarar,
Um relógio, eterno atraso,
Toda vida e lembrança a se ruminar
No omaso deste descompasso...

Bruno Borin

sábado, 20 de dezembro de 2014

Ideia de amor e de futuro


Atado a este rosto, que no intento,
Reage contrário à fome das presas,
Resguardando a mim, o ardor intenso
Dos aprazíveis sóis das coisas coesas 

Me perco do viver ao qual me misturo
Sem temor do que os sentimentos
Podem fazer dos moucos momentos,
Penso agora nos grilhões do futuro.

Do amor vejo, as ideias fragmentadas 
Entre folhas de tristeza laureadas
Com instantes da mais pura alegria

E do porvir, nada além de derreadas
Janelas, portas e casas veneradas 
Por mistérios e remendadas de memória.

Bruno Borin

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Versos morféticos


                                                  A Augusto dos Anjos

Eu, porta-voz de Augusto
Todo sofreguidão e Andrajos
Não possuo asas de Anjos
Nem vergonhas em meu busto

Prostrado debaixo do Tamarindo
Sigo em passos tortos, apenas rindo
Na euforia numerológica dos loucos
Vendo os poemas correrem soltos.

No diapasão das verdades eunucas,
Ouvi tantas mentiras e putrefatos nuncas
Que à todas as hermenêuticas negativas
Me acostumei, tragando a matéria viva.

E como todas as imprecações, a poesia;
A verve anímica de toda experiência,
Verte sem qualquer anunciada prudência
O soluçar empolado de todas as maresias

Dos sintomas e assombros do século,
Da libido e seus proibidos ecos
E de um Deus morto e soterrado
Enquanto soçobram os erráticos

Passos, em madrugadas angustiantes
Onde o que resta é engolir as viciantes
E perniciosas águas amargas como a vida
Passando as idades de forma entorpecida.

É dentro da substância unívoca da alma,
No telurismo do ambíguo sentimento,
Que o mundo e seus arrependimentos
Desaguam em solstícios de pele alva,

Posto que a mais brilhante das luzes
É responsável por nos jogar nas escuridões
Mais escuras, onde os mistérios das cruzes
Se tornam a mais abstrusa ciência das multidões.

É no jogo de cenas e sombras que mingua-se,
A vontade de progresso e os ardis do destino;
Fazendo reinar fastidiosa, como um cassino, 
A fauna das crenças em extasiante melindre.

E aqui, na recitação da crônica do mundo
Não revogo minhas nevroses; convulsas
Abstrações e indolências e; ciente, as retumbo
Nestes versos trágicos, onde as avulsas

Ideações tomam formas verborrágicas
Para retratar a música disfágica
Que neste mundo sangra incontido
Nos blasfemos comportamentos vocativos
Para a desgraça e destituição do ser. 

Bruno Borin

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

A epístola da Náiade


Que es mi barco mi tesoro,
que es mi dios la libertad,
mi ley, la fuerza y el viento,
mi única patria, la mar.
  Canción del pirata - José de Espronceda

Filha das águas,
Melodia nunca acaba,
Ondeia em luz,
Os versos de Alcaçuz.

Retrato indizível do mar,
Fulgura em acordes e versos;
Tempo suspenso, sem altar
Onde os sentimentos travessos,

Brincando com a nostalgia,
Rimam em nuvem de harmonia
O que do coração transbordou,
Com que do violão se saudou.

Âncora ao oceano, me sinto pirata.
Mesmo sem conhecer a eternidade,
Por sete mares naveguei como acrobata,
Em versos sem alguma castidade.

Na tecitura das estações, digo Adeus
Aos versos que se despedem, 
E das memórias que  impedem
As bandeiras que carrego aos léus!

 Respiro o ar da cidade, mas desejo
As brisas do Oceano das estrofes,
A Atlântida procurada nas odes...
 Só te resta então reprofundar ao Tejo!

Bruno Borin

domingo, 7 de dezembro de 2014

Dissonância


A Biwa polvórica que urde em minha cabeça
Em assomos de desejos pagãos e líricas 
Foices, aprazem o delírio da fímbria Caleça
Que ri, quando a carne se enfastia de males físicos

Inseminando amores tão irreais quanto secretos
Me convencendo possuir, de todas as grandezas
Um coração proceloso o suficiente para os poemetos
Do amor, para as sinfonias da satisfação e das belezas

Porém, do sacrário apenas fico com as sombras
Os santos todos se foram e levaram minha pureza
E as vozes das memórias me culpam por tanta crueza
Porque de sinfonia, sou em verdade as obumbras,

Plenilúnios e todas as coisas baças de se ouvir
E somente em minhas catedrais posso sentir
O mundo que me envolve em severas obrigações,
E soçobram como fúlgidas quimeras, minhas disposições

E só na arte consigo voar no delírio do verbo,
Só entre as palavras sou uma vogal completa,
Só na embriaguez do sangue sou lúcido e repleto,
Coisa feliz, triste, longe de unção, eu exacerbo,

Suspenso, considerando a hepática sobriedade,
Concílio de mistérios comungados com mentiras
Oradas pelas estrelas, porque nenhuma frugalidade
Brota, senão com as cores que das interiores Piras

Emergem, entre soluços vindos das Grades do Peito
E da dissonância de carregar asas feitas das incógnitas
Vastas, inacabadas, depenadas, que palpitam no pleito
Do próprio sentir, tão único que rebenta em tecituras malditas!

Bruno Borin

O que é um soneto?


O que é um soneto, senão parte riso
E parte lágrima que compartilho?
O instante em que a chuva nos tinge
Trazendo a saudade que, impiedosa, cinge,

O momento do abraço ou do beijo,
O carinho que viaja neste proibido Tejo,
E se faz presente onde era mais esquecido
Que sentido! É ao fim, bramido, conversas...

Aquilo com que tu, em lamento versas
Ou também, algo que perpassa teu ímpeto
E que só recobras depois da vil consequência.

Só sei que de suspiros se dá a sequência
De palavras que se juntam em inversa
Gramática, para formar um belo soneto!

Bruno Borin

domingo, 30 de novembro de 2014

Soneto do desver


O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
 - Alberto Caeiro


Baço pode ser o horizonte de minha visão,
Porém infinito é o oceano do meu coração.
Não preciso de determinadas aptidões
Para alçar voo ao recanto das imaginações.

Para onde vão, ninguém leva seus primores,
Mas quem onde está não quer colecionar amores?
O que quero eu da vida? Senão cantar os licores
Que me afastam os temores, e me apregoam valores..?

Prefiro não saber o conteúdo das partituras
E cantar sem comedimento as iluminuras,
De que oiço falar os deuses e suas vindimas!

O que são dos céus afinal, além de vagas pinturas
E dos passos então, alfombras de torturas?
De fato, se o soubesse não cantaria minha própria desestima.

Bruno Borin

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Assim faz a poesia


Algo existe num dia nublado e de leve vagar;
Algo que me impele a lentamente fustigar

As paisagens e fazer sobrar as ideias, 
Seja acalento ou indiferença, a candeia

Responde, inquisitora ao que apenas observo
E mesmo receando velhas imposições, o apego

À palavra me desfaz a escrever, como se um guia
Tivesse, a auxiliar esta complicada travessia

Com a imaginação tão viva quanto a experiência
Invivida, vou a tecer um caminho de reticências...

Pública, como uma névoa a se espalhar
Criativas, as palavras, pela mente a se assentar

Assim faz a Poesia; cerze verdades por desmedidas,
Desponta realidades onde deságua a fantasia,

Compondo das luzes que se derramam
Os silêncios que pausadamente emanam

Das muitas vozes dos homens que, em rotinas
Se prenderam, vestindo-as como opacas cortinas

Fazendo de seu sentir uma sede desenhada
A ser saciada em fontes há muito escassas...

Talvez por minha visão baça, os dias passam
E o cinza fica, a tornar minha alma tão colorida,

Pois no olhar que tanto, tanto procura
Está talvez alguma desconhecida cura...

Bruno Borin


quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Elucidação


Peguei do meu coração atado
E pelos vagões da memória o levei
Até que, no instante inexato
Da tênue desmedida, o depurei;

O depurei das ecoantes solidões
Que lavam de presenças encrustadas,
A alma da gente, vertida e ignorada,
Com dolorosas e pacientes emulsificações.

E pensando nas dolentes significações
Fico suspenso nas promessas que cometi
E que ao decorrer do endurecer, inadimpli
Percebendo o quanto cedi das próprias proporções.

Trancado, junto aos poemas que jamais escrevi
Pairava em mil sóis tão salobros, que o código
Que eu portava tão inconsequente e pródigo
Em profuso palor se verteu, raptando tudo quanto vivi

Me apartando da fluidez do tempo e espaço
À maneira da metáfora mais vívida, a vida mais baça,
Mesmo sem ponta solta, amortecia minha queda
Que era como mergulhar na interior alameda

E debruçando inocente, sobre mim mesmo; 
Tomando o papel principal do espetáculo
Jamais incutia o primogênito receptáculo
Da vida que eu levava a um certo esmo

Pensando ser normal ter os horizontes desbotados
E carregar culpas mais brilhantes que as estrelas
Deixando que elas falassem em nome das minhas trevas
Que, escancionadas já se apresentavam desbravadas...

O que fazer com tanta vida? - Hoje me pergunto
Quando realmente "não posso" - A tudo avulso,
Comungar da beleza, os sonhos e a sabedoria
Trazendo à minha vida, o que há de mais livre, a alegoria...

Bruno Borin

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Promessas


Tantos mundos prometidos
Permeiam os desejos repetidos
Por horas, os quereres infindos
Assumem discursos tão lindos

E contra estes apenas o peito
Contraído, como se se doesse,
Condoído pelo inquirir estreito
E com receio, como se se perdesse,

Não sei se por retórica ou inanição
Me cai como a Sísifo caiu, em rolamento
A vontade de fuga ou a mera inação;
E a penha como elevado arrebatamento

Com o mesmo teor que não enlaço
Minhas pequenas certezas, 
As minhas ousadas transcendências
Se devem ao suspiroso embaraço

Quisera eu ser de Olás tanto 
quanto sou de Despedidas...
Quisera eu ter a rebeldia 
de quem muito amou 
e juntou as mãos atrevidas...

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Transver


À luz do vinho
é céu ou delírio, aquilo
Que, feito linho

Risca o pergaminho
Do meu destino
Feito um raminho

Que pulsa, hirto
Em tortas ramagens 
Tecendo mortas tatuagens

Amorfas, tal fátuo
Lume, o da inspiração
Que jamais respalda a respiração.

À luz do vinho
É no céu do meu delírio, que avisto
O verso do meu caminho.

Bruno Borin

Lapsos


Tão denso é o ritmo da vida
Que nem percebemos os batimentos
Dessa lépida desmedida

Mouco tempo para tantas cores;
O mero decifrar dos acontecimentos
Nem arrefece o denso ramalhete de dores

Transbordante é o caminho de se ir embora
E o ranço de olhar a não-volta que faço
E constatar a conspiração em que me embaraço

Sei os gestos todos, sei das certas maneiras
Mas não sei se meu próprio cansaço
Pulsaria contra todas estas vagas e faceiras

Formas embevecidas das muitas maldições 
Que digo carregar, e que dizem me levar
Sejam elas reais, ou somente invenções...

Bruno Borin

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Trancado


Quando foi que girei as fechaduras
E me tranquei dentro de tantos outros
Estes tantos quartos sutilmente salobros
Com suas escuridões tão, tão duras...

Tão escuro, tão firme, quanto presente
Este Outro: pés, mãos e rostos indispostos
Que fito perplexo: Olhos que não me sentem 
E Sou tão sólido quanto meus suspirosos 

Eus, que também são Outros, pedaços
Extraviados, feitos de pano tão garboso
Que na tentativa de me descobrir, ouso,

Mesmo temendo o material, com baços
Tateares, sentir o frio que em verdade
Era meu antes mesmo de ter multiplicidade!

Bruno Borin

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Embora cair seja a regra do novo mundo...


Me visto de outono
Para colher os estranhos buquês
Que nascem no solo do meu espírito...

Mesmo em estiagem
O choro é o regar;
O chover, o reger 
Da sonhada orquestra

Raízes alastram-se agradecidas
Folhas zombam penduradas
Meneando uma dor
Que nem anjo caído entende

Mesmo em estiagem
A lágrima é o pulsar
E o orvalho, o manchar
Dessa eterna festa

A estalar nos fragmentos 
De meu interior propenso
À intensidades errantes
E à calamidades itinerantes

Ora ermo, ora aurora
Procuro, desarranjado
O que fui outrora...

Bruno Borin

terça-feira, 28 de outubro de 2014

O suficiente


Um punhado de luz e um pouco de trevas
É tudo que se espera em um canto escuro
E é tudo que se guarda na salobra penumbra
Onde dualidades se encontram mas não se chocam
Ao me encolher, me resumo
Querendo do muito que somos, um pouco

O suficiente para ser eu, encolhido 
Em um canto do quarto
Como um punhado de palavras
Soletradas em um rascunho esquecido

Áridas, as horas me adentram o ouvido
Perpetrando a minha condição de recolhido
Entre tantas audácias, nenhuma requerida agora
Entenderia a maior delas, - a cáustica ideia
Que me dilacera feito o deglutir de um velho vinho 

Quebrar minhas imagens - E viver de meus segredos
Ou deixa-los, sombras contra as paredes
Escoar em verso livre, no dedilhado corredio
Do calar-se...

Bruno Borin

sábado, 18 de outubro de 2014

Do muito que me tenho perguntado


Que constelações busco eu, no céu do meu devaneio?
Que intempéries chovo eu no horizonte da minha vida?
Se nas siderações em que perco meus rostos, não há enleio
E as nublações não forem mais do que a remessa prometida

Das lágrimas que não consigo guardar por meramente, 
Delas escoar os bramidos de uma resistência vencida;
Que ao se manter, pródiga, consome tudo o que sente,
E ao se confrontar, encontra a alma adornadamente arrefecida?

Embora não mais saiba onde estão as românticas alvoradas
Os meus sóis, ao arderem em flavas flamas, demonstram-me
Caminhos remansosos como o curso de fantásticos orbes
A rumar por calmas feições, no esboroar das velhas queimadas

Deixam-me à deriva das próprias florações, paisagens
Tão finitas quanto a própria brevidade do sentir,
Até que o urgir do real decisivo, e seu pesado pungir
Exigir de mim o farfalhar da troca das obtusas folhagens
Demandando um cruzar além dos interiores oceanos,
Fronteiras proibidas, conciliadas com as novas ramagens...

Bruno Borin

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O grito das fúrias


Com a alma prostrada em preocupações
Deleito-me com o grito da Fúria
Composta de toda a infame centúria 
Das pequenas e acumuladas incomodações

De mansa quietude, a Natureza
Flui em cascata, para densa melancolia,
Urdindo as corrupções da incerteza,
Propagadas nesta incólume ventania

Dos frutos destes estranhos sentimentos
Não consigo decifrar, sob os olhos rancorosos
Destas Fúrias de rapina, o paladar rançoso

Das rupturas momentâneas dos meus sacramentos,
Tingidos com a cor destes gritos pavorosos
E com o timbre da alma desconsolada e ruidosa! 

Bruno Borin

domingo, 5 de outubro de 2014

Por amor

Um soneto, apenas um soneto
É o que queria muito fazer
Antes de por amor, fenecer...
Qualquer que seja, o  poemeto 

Não seria por vaga razão;
Meu complicado bulir
Jamais deixaria o afoito palir
Dizer por si a maga abrasão

Seja por não remeter a alguém
Ou por vários deuses louvar,
Sei que o que não tento contar

É meu passado ou meu conjecturar
Futuro, com tantas coisas a vivenciar
Mesmo ainda com palavras a remontar...

Bruno Borin

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Versos alegres


Tudo quanto me dói, escrevo:
A alegria - gentil descamação da alma
Na poesia, urge como ramos de trevo
Jamais daninha, muito menos falsa

É o fog aclamado da verve
Plenilúnio do meu querido sentir,
Que às elevações fazem seguir
Mesmo nas abstrações nulinerves

Febril florescência, faz-me sonhar
Acordado, cerzindo a realidade,
Cavalgando nas Nues e Quimeras

Encarnadas de meus ideais a realizar;
Sob o manto das eternas e graciosas óperas
Como se pudesse exercer minha fanal multiplicidade!

Bruno Borin

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Dialética - Uma crônica dos sentimentos



Estalando na noite o crepitar que acossa o alvorecer
Laivando com o absurdo da neurose o ambiente
Sob a lua que se surpreende com o minucioso repente
Das intrépidas águas de um pluviosê adiantado, ao arrefecer

Suas torrentes sobre o negrume flamal, dardejando irreverente
A condição de inconstância do fogo, que crepitante,
Retrucava sobre a intempérie para a madeira emoliente:
- Eu, presente de Prometeu, como pude ser tão imprudente?

A água, apenas torva ficou, não revelando emoção alguma,
Diante da psicótica fogueira que plangia na floresta,
Mesmo sua interação inusitada sendo vista por qualquer aresta
Formando rasas poças ao redor do clarão que cedia às suas espumas

A flama não se deixava amedrontar pela vaga intrepidez do derramar,
Que bradava: - Achas que controlas teu vazio crepitar, afoita destruição;
Sou a Regente da vida e do clima, tudo depende do meu fomentar;
Enquanto tu, ó abrupto calor, só propagas a descomunal corrosão!

A vermelhidão juncada aos retorços, involuntária, se condensava 
Convulsa e sonolenta, praguejando o lânguido feitiço
Que cumulava sobre seu ignóbil âmbar inteiriço
Tragando a razão dos lábios que beijavam a lenha que carbonava:

- Eu, presente de Prometeu, ardo desde tempos imemoriais
No coração dos homens, não posso ser por mero evento, vencido...  
- Tu, presente? A vida é o repente que eu propiciei! És mero rútilo!.. 

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Antes que o diálogo pudesse terminar, os céus, como pulsação
De súbito clarearam, conquanto  da flama apenas brasa restou
Do calvário dos incógnitos amantes, o gravame silêncio os divisou 
Poças e brasas, pequenas ondas e vapores, estalares de mistificação

Onde fragmentados, os dizeres por assim ficaram, 
Odes ecoantes apenas aos seres da floresta reveladas;
E conquanto dissipavam o orgulho das dialéticas relvadas, 
Os sonhos das árvores, na fuligem findavam... 

Mal sabia a água que a flama é um grito do tempo
Contra ele mesmo, por acumular vidas demais
E também mal o feroz rubor conhecia das águas
Sua eterna transição; e que representa o alento
Etéreo do novo fôlego após o grande brado,
Pois como é sabido, do caos surge a nova ordem
Enquanto estes velhos amantes se colorem...

Bruno Borin

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Se eu fosse eu



Se eu fosse realmente eu

Arrancaria essa minha pele
De pudores e de morte gradual

Pegaria da primeira coisa que avistasse
E iria embora, simplesmente ir embora

Sem despedida; não seria reconhecido mesmo

Iria embora sem dar aviso, não importaria mesmo

- Porque o eu é um outro...
O eu é um outro?..

Pego desse pensamento, mastigo...
De quantos outros é preciso para formar um eu?

Um pedaço só de eu, inexato, dormente... Cansado
Casado com as vicissitudes de todas as personalidades

E com a virtude de todo o ascetismo possível
E muita, muita inquietação...

Sim, eu iria embora

Para onde?

Se eu soubesse,

não seria eu...

Bruno Borin

sábado, 20 de setembro de 2014

Rupturas


O próprio verso o diz
Mas o que realmente fiz
Foi mais que cortar-me
Foi perder-me.
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Sob matizes despigmentadas e esparsas,
Minh'alma corteja bailando, 
As cicatrizes que vão formando
As dezenas de rupturas em marchas.

De eternos e languentes amores
A cintilar nas inspirações,
Apenas senti efêmeros fulgores
Constituindo carnais contrações.

Diluindo-me em montantes,
Achados nos alheios horizontes,
Mas perdidos aos montes,
De meus próprios caminhantes.

Que amargas palavras procuro
Para descrever as doces dores
Que pairam em meu céu obscuro,
Céu desses encantados, amores,

Que de espontâneos martírios,
Discorrem eloquentes delírios
Que, de rima em rima me desmontando
Vão, na medida em que vou amando.

A taça da ventura, nem sei se a sorvi,
Só sei que bem-aventurado, sorri,
Mas conhecendo de Sua foice ambígua 
Sei que esta atuação me é contígua

E não adiantam grinaldas d'oiros,
A locupletar meu lânguido martírio;
Jamais escutei um único suspiro,
Dos variegados e idealizados Zéfiros

A habitar meus profundos silêncios
Se comportando como se fossem
Antigos moradores que se creem
Ser meus verossímeis Concílios...

Bruno Borin

domingo, 14 de setembro de 2014

Quando não mais puder


O que será quando não preferências
Eu não mais puder ter? Fico a pensar
Cheio do drama e da incoerência,
Pairando sutil nas palavras a bradar...

O meu nome? Não, não, este 
Ficará somente entre os escritos
Já não mais o carregarei, pendente
De epitélios a se desfazer, proscritos
Das saudades que, tonto senti,
Das chuvas que me sorriram
E em todos os dias que morreram
E que foram aquilo que vivi...

 Não mais importam - A mente absorta
No poema ou no qualquer agora 
Este ou outro poderão ser a porta... 
A definitiva Porta para o não agora.

Bruno Borin


domingo, 7 de setembro de 2014

Como é triste, chover e desfolhar sem endereço!


É sonho ou convicção, confiar 
nos toques do destino a se fiar, 
Por intermédio de minha vontade,
Com uma dosagem pura de vaidade?

O que é suficientemente sólido,
Para que eu chame de minhas forças:
Aquilo que me detém de ser mórbido?
Ou isto que me impulsa além das formas?

Ao Ser folha caída, temo sopear a mim
Todavia, ao Ser Vívidas pétalas, temor de Jasmim
Me apetece; e em longas dores, assim escureço.

Suplico, o que é Ser que tanto exasperam?
O que é este Viver que todos bem aparentam?
- Como é triste, chover e desfolhar sem endereço!

By: Bruno

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

About the nature of light


My burning soul
Full of dreams 
Gently swims 
Whithout whereabouts

Thrilled with impetuosity
I sing the enlightenment
Of being the assayed entity
For the Words of ravishment

Singing for no one
Brings everyword 
Every effort worth
Than to choose only one

The path within, 
True Light of the grimoire;
Life's ultimate soiree
Becomes, This Genesis 

From Darkness itself  
Becomes the sense of Myself
True inner lumen in exchange 
Of the World's rough spelling.

Bruno Borin

Juízo de valor

Com minhas mãos tão humanas como quaisquer outras
Qual metafísica poderia mover ao junta-las?
Com a finitude dos acordes de cítaras salobras
Que corações poderiam tais feitiços, conjura-las?

As sugestões que faço a mim, não são seguidas
Levo-as longe do patamar da dúvida, as arrasto
Para o pedestal da poesia e delas valho, me basto
(Tantas mensagens, somam o medo de torna-las lânguidas
Convicções);

E de tantas sensações, aflora o morno sentimento
Não de abismo, não de eterno, mas de mundo;
Do qual libertam-se narrativas como esta

Não calorosas façanhas ou gélidas decepções acometendo
Apenas o caminhar estável munido do juízo profundo
No qual emolduro-me em incógnito estro... 

Bruno Borin

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Andanças interiores


andando pelo vale profundo
de meu coração

na seca paisagem
do inverno 
a chuva tenta chorar

palavras derruídas
de significado

mas o meu sentir
só permite a ida
até a imaginação 

a volta, na escura vida
sou acompanhado 
pela lua

que através de meus passos
enxerga sua luz no mundo. 

Bruno Borin

Das minhas metáforas

Inverno do corpo,
Outono do pensamento
Primavera do sentir...

o chamado é morbo
Não respondo bem ao encaminhamento
Não sei se posso me permitir 

Meu interior absorto
Não sabe se quer o acontecimento
Da realidade a bramir

O repercutir louco
Não dos ideias contramovimentos
Mas do descontrolado sorrir

Pleno e fresco desassossego
Rompimento das verdades é aprendizado
A não conter vã a beleza

Do julgamento, livre é o córrego
Sinuoso do viver libertado
A despir-se em natural pureza

Demasiado para a fé o ego
Se rende ao concerto agoniado
Da fenda conspícua de clareza.

Bruno Borin

Shadow People


Não estamos seguros
eles entrarão pelas portas.
Quebrarão as janelas,
adentrarão em nosso quarto,
revirando nossas cobertas;
Lerão nossos livros,
escreverão em nossos diários
vidas apagadas em tramas banais.
Farão refeições em nossas mesas,
ventarão em nossa cortina, 
nos observarão em nosso íntimo
e esperarão, sim, vão esperar, dispostos
 nos acostumarmos com suas presenças,
nos fazendo acreditar serem partes de nós!
As coisas que vemos passarão despercebidas
até que esqueçamos,  de tanto conviver,
no corrido cotidiano.
Até um dia, um fatídico dia,
na súbita mudança de postura, 
na imperceptível penúria da memória
quando não forem mais do que meras sombras
eles assumirão nossas vidas.

Bruno Borin