terça-feira, 28 de outubro de 2014

O suficiente


Um punhado de luz e um pouco de trevas
É tudo que se espera em um canto escuro
E é tudo que se guarda na salobra penumbra
Onde dualidades se encontram mas não se chocam
Ao me encolher, me resumo
Querendo do muito que somos, um pouco

O suficiente para ser eu, encolhido 
Em um canto do quarto
Como um punhado de palavras
Soletradas em um rascunho esquecido

Áridas, as horas me adentram o ouvido
Perpetrando a minha condição de recolhido
Entre tantas audácias, nenhuma requerida agora
Entenderia a maior delas, - a cáustica ideia
Que me dilacera feito o deglutir de um velho vinho 

Quebrar minhas imagens - E viver de meus segredos
Ou deixa-los, sombras contra as paredes
Escoar em verso livre, no dedilhado corredio
Do calar-se...

Bruno Borin

sábado, 18 de outubro de 2014

Do muito que me tenho perguntado


Que constelações busco eu, no céu do meu devaneio?
Que intempéries chovo eu no horizonte da minha vida?
Se nas siderações em que perco meus rostos, não há enleio
E as nublações não forem mais do que a remessa prometida

Das lágrimas que não consigo guardar por meramente, 
Delas escoar os bramidos de uma resistência vencida;
Que ao se manter, pródiga, consome tudo o que sente,
E ao se confrontar, encontra a alma adornadamente arrefecida?

Embora não mais saiba onde estão as românticas alvoradas
Os meus sóis, ao arderem em flavas flamas, demonstram-me
Caminhos remansosos como o curso de fantásticos orbes
A rumar por calmas feições, no esboroar das velhas queimadas

Deixam-me à deriva das próprias florações, paisagens
Tão finitas quanto a própria brevidade do sentir,
Até que o urgir do real decisivo, e seu pesado pungir
Exigir de mim o farfalhar da troca das obtusas folhagens
Demandando um cruzar além dos interiores oceanos,
Fronteiras proibidas, conciliadas com as novas ramagens...

Bruno Borin

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O grito das fúrias


Com a alma prostrada em preocupações
Deleito-me com o grito da Fúria
Composta de toda a infame centúria 
Das pequenas e acumuladas incomodações

De mansa quietude, a Natureza
Flui em cascata, para densa melancolia,
Urdindo as corrupções da incerteza,
Propagadas nesta incólume ventania

Dos frutos destes estranhos sentimentos
Não consigo decifrar, sob os olhos rancorosos
Destas Fúrias de rapina, o paladar rançoso

Das rupturas momentâneas dos meus sacramentos,
Tingidos com a cor destes gritos pavorosos
E com o timbre da alma desconsolada e ruidosa! 

Bruno Borin

domingo, 5 de outubro de 2014

Por amor

Um soneto, apenas um soneto
É o que queria muito fazer
Antes de por amor, fenecer...
Qualquer que seja, o  poemeto 

Não seria por vaga razão;
Meu complicado bulir
Jamais deixaria o afoito palir
Dizer por si a maga abrasão

Seja por não remeter a alguém
Ou por vários deuses louvar,
Sei que o que não tento contar

É meu passado ou meu conjecturar
Futuro, com tantas coisas a vivenciar
Mesmo ainda com palavras a remontar...

Bruno Borin