Alguém me gritou de dentro de uma poesia
Que a vida é breve e cabe inteira e completa numa pétala
Vi-me, então, compreendendo desde cedo o idioma secreto
Das lágrimas, vedado ao berro regressor e prepotente
Mas no caminho, me perdi na fronteira entre sonho e realidade
Onde é tudo azul e ninguém mais tem adjetivo de morto ou vivo
Só o vício de ser orgânico combinado com inorgânico;
Ter nas mãos a eternidade mas não ter matéria para segurá-la
Eis que uma pomba, portando a procuração do céu
Zomba de mim, itinerante cartorária dos seres voantes
Não me importei... A lembrança do grito me fustigou a visão
Conectei isso ao signo que as folhas me desenhavam
Então tive um norte provisório, carimbei no passaporte
E bebi do vento a direção, me juntei aos que voam
Porque os que andam me entediaram, me rejeitaram
Não se pode ter duas pernas e uma asa só
Só se pode ter pernas ou asas, desejo aqui é infungível, viu?
Só vogais e consoantes se misturam, asas e pernas, jamais!
Mas sabe? Eu já quis ser árvore, quis abdicar da leveza
Quis raízes fortes e impregnadas do lenho pivotante do legado
Mas, me resta a metamorfose, ante ao ocultismo da palavra
Ou à sobra da revelação do texto diante dos leitores
Resumo a transparecência do meu desejo
Numa singela camélia, bailarinística Camélia, confidente flor
E em meus braços, não cabe a ruína aurórica de tudo
Que eu quero preservar, de tudo que eu não queria abandonar
Me resta então arguir à fogueira que queime brevemente
Toda a metafísica que há na fábula que sonhei
Porque há na fábula a exatidão da mensagem
E eu prefiro a incógnita incipiente
Do polinômio oligofrênico,
E da ignorância sem freio
Daí nasce a experiência somática
Das dores do mundo, sem a pressa do tempo
Eu sei, eu sei! As corujas devem escutar muito bem
As irregulares batidas do meu coração
E pensar cada besteira dos meus pulsos
Queimados pela purgação da mora da minha eternidade
Eternidade que eu sempre negarei
Com passos errantes de menino
Porque eu nego o tempo! E com os olhos que tenho
Não distinguo o que foi do que virá!
Bruno Borin