sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Exumação


I

Abre-se o caixão onde repousava
Uma alma qualquer que pelo mundo andava

Mexe-se calmamente na ossaria
Sem nenhuma romaria

E então remonta na mente
A memória penitente

De uma vida passada
Por lágrimas acalentada

Corpo acometido de terrível doença
Recebeu do destino uma dolorosa sentença

E o seu perfil se torna um saudoso vulto
Como santo de altar esquecido, sem culto

E eis que de imaginar não evito
Perseguido pela minha sina de maldito

Retumbando um clima incisivo
Bordado pelo pensamento do ausente infinito

Então entendo que meu peito mais dilacerado
Não fica, permanecendo eternamente exulcerado.

II

Sim, já ouvi um vez a Tua trombeta
A ecoar pandêmicamente pelo planeta

Como o suspiro que me prostro a imaginar
Por qual mar seco, por qual árida terra, irá ecoar!

Tu que encaminhas aqueles que na luz padecem
Tu que persegues os vultos que desaparecem

Conheço o galopar do teu cavalo baio
Que esparge a cada trote, como um raio

O miasma esquálido da decomposição
Enquanto murmura teus satanismos além da compreensão

E eu deliro com o vislumbre puro
Com a tua sombra costato e me torturo:

A rigidez cadavérica
Da tua fronte esquelética

Boceja arfante
Frente ao fato gritante

Suspirando putrefação
Exalando a contaminação

Dos solos, das águas, das memórias
Sinto do Tigres, do Eufrates e até do Nilo a miséria

Que teus passos mordazes
Causaram, acompanhados de vários Satanases

E assim a tua lida foi, pelo tempo perpetuada
Fardo terrível esse que estás alçado

Tanto tempo neste divagar medonho
Aposto que já não distingue mais realidade de sonho!

III

Cavaleiro eu te reconheço 
Preso no amargo preço
Da espiral cármica
Emanada da energia cósmica

Ciclo inquieto e nada secreto
Eterno porém efêmero
Fonte do teu desespero
Inquebrável decreto

Por isso arfas bocejante
Martirioso, ansioso, pesaroso
O tempo é teu adorno degradante

E tua espada que risca o ar de escarlate
É a única que compreende o teor penoso
Da tua sina em constante disparate.

By: Bruno Borin

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