Os impávidos soldados de terracota em seus tempos áureos,
tempos de exímia pontaria, tempos de sangue e medo, combateram fervorosamente
hordas de mongóis e diversos outros inimigos do império. E em seu enredo
magnânimo e mágico, hoje obsoleto como todo antiquário desfrutam de petrificada
paz, emudecida e matizada pelo capitalístico ritmo dos flashes dos turistas
ávidos por um bom ângulo, triangulando suas posições sem imaginar a glória
deste magno exército, excelso em batalha, porém péssimo em seus lares, em que
deixaram seus filhos talvez cianos, suas mulheres magentas. Filhos magros, mães
desesperadas, procurando um método à moda de seu século, de ganharem seu
sustento.
Merecedor de pergunta é o sangue que tinge rubramente cada
espada, cada lança, cada armadura vencida, será que esta é a origem de suas
cores, meu pétreo exército? Ou é só a cor angustiada da terra que os cobriu,
quando sua utilidade foi repensada? Relembrar seus tempos é como o ressoar do
sopro de uma flauta. Seu lirismo épico é constituído das mesmas forças que
atuavam nos campos de batalha, forças estas, que não permitem que a verdade
seja extraída. Forças que perpetuam as lendas nas vozes dos bêbedos bardos que
cambaleiam de vila em vila, espalhando este etéreo folclore.
As dobras que o tempo acumula em seu lenho, demarcam as
aspirações fantásticas, soberbas dos povos. Seu povo, Imperador Qin, não seria
diferente, assistiram surgimento dos estados guerreiros, calados, apenas esperando
a mão grotescamente fina da unificação deitar sobre os ombros do império e
assim cessar a sua violenta conquista!
Eis que perquiro novamente se as mesmas dobras temporais poderiam despertar
de seu sono milenar os imortais Guerreiros de Xian tão logo o capitalismo feroz
ruísse quanto a China assumisse o posto de maior potência do mundo. Pois não
bastará a abnegação feita pelos continentes ocidentais, eles lutarão por seu
superficial comodismo, seu lúdico controle mundial, enquanto, a população,
ludibriada pelas inúmeras mentiras conspiracionistas, assistirá a renovada
Ascensão destes impávidos Soldados. Por que há, nas monótonas pontas de destino
o mesmo riso escarnioso que havia nas bocas sanguinolentas daqueles generais
chineses de outrora, hoje eternizados nos livros de estratégia bélica, que
muitos de nós interiorizam em seus jogos pessoais de poder. E enquanto houver
esse riso tenebroso, essa necessidade arcaica de domínio. Haverá utilidade para
os guerreiros de terracota.
By: Bruno
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